sábado, 30 de outubro de 2010

SEIS PEDAÇOS

Da cadeia




I


Arcabouço





Os túneis das indiferenças percorrem

a vastidão





                                                                                                                             do simples existir



Reduz aos arcabouços, a vastidão e



a simplificam









Como o velho Juca, garimpeiro,



e a sua terra

                                                                                                                               arreganhada





Ele simplificaria a vida num lote de pedras comercializadas



Num lote de palavras assimiladas pelo peso e

                                                                                                                              colorido





Daí saem arcabouços simétricos para romper paredes





em novos e gigantescos túneis e novas e arregaçadas catas.






II




Amigo, não ironize os poetas.

Apesar de tudo,

eles existem.



Poesia é um pão misterioso

que explode-real nas horas precisas.



São palavras disformes

(antes, provavelmente, harmoniosas)



Sempre



ajuntamentos de belezas.



Veja,



quando for possível

descubra a beleza nas palavras.



Em tuas horas, nada acontecerá

a não ser aquilo que queres

e vida poesia será

será um verso





Ora, direis, rugir bosques!



Será um lamento.

Prêmio ao silêncio.



III





Um relato sem marcas











Um pátio pequeno

De muros altos



No centro,

um tabuleiro de xadrez.



Não é hoje o dia do jogo,

as peças caem aqui e ali,

amontoadas num canto só,



pretas e brancas









IV







Para Você





Viva o alfabeto!



Viva o bobo!



Viva o mentiroso!



Viva o tolo!



Viva a ignorância!



Viva o belo!



Viva eu!



Viva você!



Viva o tal!



Viva o qual!



Viva o sal!



E o saleiro também!





Sabe quem grita estes vivas para você?



Viva!







(Uma brincadeira de presos em celas individuais, sem comunicação e proibidos de conversarem)



V



Pensei que fosse possível

afastar-me da identidade



Compreendem?



Mudar o papel, mexer nas aparências

Realizar um distanciamento cênico comigo mesmo

Tentar, tentei, ainda tento, visualizo um objetivo

Intrigante, sem nexo imediato.



Instintivo, recuo




Armazeno recursos, sem condições de dizer

Nem de ser preciso.



- Os recursos são esses.



Apenas sei que exigem controle.





VI






Em memória


das horas difíceis,


folheio o dicionário


na pista da palavra


que seja verdade


que exprima


as horas difíceis


que fotografe


o gesto presente.






Naqueles momentos,


folheio o dicionário






e outro dicionário






ainda na perseguição


da palavra


que eu sei desumana


que eu sei ser totalmente ódio


que eu sei possuir nas linhas


de suas vogais o acento trágico.










Folheio o dicionário,


em memória


das horas difíceis.