segunda-feira, 24 de outubro de 2011

RELATO DE NUVENS






Nuvens feitas de ilusões
onde passa o jato
Onde deixo a tarde...

E aí Soljenitzyne falou:
- Pode um homem ser sempre prudente
e continuar a ser homem?

A bacia em que a mulher dá banho
no menino.

As nuvens são como fórmulas
 estendidas pelos ventos.

Alguém escreve sinais com as nuvens
(na linguagem dos ventos)

 Nada fica, nada permanece
(nem eu)

Nuvens cheias de caretas

- Você acredita no trabalho?

É a filosofia de Cândido

Se ela soubesse pensar
Não faria tanta estupidez
Finge amar, desprezando-se

- Veja aquela nuvem

- Qual?

- Ali


- Não distraia minha atenção,
os viets estão perto de Na Loc


Paro o trabalho na seção de teletipo
com nojo das covardias dos sams



Toda guerra é nojenta e fede

O pior é que fede sempre

A propaganda de quem não tem razão
é escandalosa,
feita de gritos,
muitos mais morreram do seu lado
minha cifra de mortes é segredo
quem grita mais
nem sempre pode mais
Nem sempre
Quase sempre


Um dia ainda vou fazer um poema
sobre estas nuvens

- Por que precisamente sobre estas?

- São nuvens vistas do pátio da prisão 
em Linhares iguais a tantas outras, 
vistas de tantos outros pátios

- Sim, de outras prisões, de outros claustros

As nuvens são belas

- Todo dia, converso com as nuvens

(Rsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrs)

- Elas amedrontam

(Rsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrsrs)


- Insistem em dizer-me que tudo passa

- Sério?

- Sério.


(Silêncio e os dois olham para o céu. Sem nuvens)






.......