
Feio na foto
De Adamastor Ostia
Você sabe escrever. Pode, muito bem, escutar as minhas histórias. Histórias que não sei se vão cair no agrado do povo. Não é troço de imaginação. São coisas da vida. Sei que o povo gosta da vida e de todas as suas coisas, gosta do falso e do verdadeiro, da agonia e da alegria, da fantasia e vai gostar de Ada. Ada é a realidade. O povo não gosta é de ser infantilizado, de ser tratado como se ele não tivesse o seu ponto de vista, de que ele não soubesse nada da vida e de que ele fosse ignorante.
Eu trago coisas da vida, dessa vida que acaba. Essa vida sem nada. Todo mundo pensa que sua vida foi diferente. Engano maior. Ninguém ama diferente. Cada um é um. Meu azar foi nascer feio. Foi azar? Feio... Ah! isso era verdade. Nunca vi uma fotografia minha que eu gostasse. Nunca gostei do resultado. A gente não acredita naquilo que é.
Eu fui um homem que sempre teve medo do espelho. Covardia. A velhice é igual pra toda gente. Somos todos feios e simpáticos. Sobreviventes. As pessoas diziam que nariz grande era feio, o meu era maior. Minha testa, meus cabelos que nada segurava. Goma nenhuma segurava.
Uma única mulher me amou e ela me desamou e me fez ridículo para os outros. Muitos olhavam para mim e riam. Eu também ria. Pura boa vizinhança. A mim, a mulher que me amou dizia que eu era o seu feio querido.
“Meu feio”, ela dizia.
Eu pagava para possuí-la, pois sabemos que muitas são as formas de se efetuar tais pagamentos. Eu pagava dinheiro mesmo. Quantos não vêem a gente de um jeito diferente? Quantos não nos amam e nós não percebemos? Quantos não nos odeiam sem que ao menos percebamos a intensidade desse ódio e nem o porquê? Quando nos sentimos bem, quantos não nos têm amizade por isso? De quantos ângulos se vê uma pessoa senão em cada uma de todas as visões de quantos convivem por aí a fora e que nos cercam com suas amizades e os seus ódios?
Você nunca observou as pessoas feias, muitas vezes elas não o são. Elas se julgam feias. São as pessoas envoltas em roupas, enfeites, cheiros, acessórios, cosméticos. Muitas vezes carregam um bem desenhado tecido, fui um feio sem enfeites. Sabia ser feio. Eu me julgava o feio mais belo dos homens. Nunca me perturbei. Em quais valores? Não nos dos outros. Mas em valores descobertos por mim. O senhor pode escrever? Quer ouvir minha história? Escreva-a se quiser, pode ligar o gravador de uma vez, já disse minha idade, vou ultrapassando os oitenta. Minhas pernas cansaram. Mesmo assim ninguém consegue acompanhá-las ao amanhecer. O senhor ri. De que o senhor ri? Sou um homem forte. Ainda que feio, muito feio.
- Velho e feio. Velhice e feiura misturam-se, igualam-se. São companheiras.
- Velho e feio. Velhice e feiura misturam-se, igualam-se. São companheiras.