terça-feira, 25 de maio de 2010

ATÉ O ALTO DA SERRA DO CAPARAÓ




Poema Velho



(Recolhido do Caderno Lichtenberg,



provavelmente do final dos anos 60)







I



Antes fui um aventureiro



que abandonou a montanha



andando pouco a pouco



seus olhos pelos vales e vida.







II



Ouço passos lá fora



Ouço passos no meu coração



São passos de quem corre



Até um abraço de quem



nunca mais se esperava ver.











III



Deram-me uma máscara



Era um sorriso de felicidade



Tudo pareceu tão natural



Que o espelho convenceu-me.



Eu era alegre



Ri e despertei em outros a alegria



Mas antes que a festa acabasse



Vieram me tirar a máscara



Arrancaram-me o coração.







IV



Rasgo minhas entranhas



Procurando meu destino



Entre meus dedos escapam



minhas entranhas e minha vida.







V



Entram na escuridão



Meu sangue e meu corpo que lateja



Entram em seguida



Os braços cortados



minhas mãos separadas



uma calça cinza



Entram na escuridão



Dois olhos que ninguém



diz se são de tigre



ou de anjo.







VI



Não sou um homem livre



Antes de ser qualquer coisa



serei livre ou não serei nada.







VII



Não há ironia em meu olhar



Você enganou-se desta vez.



Há cansaço



Não há dor em meu olhar



Há uma pequenina



história de amor.







VIII



Não acompanho ninguém



Se erguem bandeiras



Desafiam-me a rebeldia



Se erguem palavras-de-ordem



Dão-me vigilância



Somente acompanho até o monte



dali volto de novo



para meu canto



de atalaia,



sempre disposto a largar tudo de novo



todas as vezes em quem for necessário



ir com alguém até o monte.