Caapós,
um povo da floresta
Meia noite, na Tv da Câmara, ali está Darcy, de novo, agora de cabelos brancos, longos, bonito e simpático, como sempre, dando dignidade à vida, à velhice, à resistência, dando dignidade a todos nós.
Ele é o narrador do documentário de um dia, do amanhecer ao anoitecer, na vida de uma família de índios Caapós. Um homem forte, totalmente nu, uma mulher jovem, seios pequenos, duros, apontados para cima, usando uma saia, e um menino de mais de um ano.
Ao anoitecer, cena final: a índia deitada em sua rede abraçada ao filho que dorme.
A imagem congela a cena.
Darcy conta: tempos depois daquela filmagem, o homem morreu. O menino, voltando dias depois da floresta, disse que o seu pai o chamara.
Ele deitou na rede e morreu.
Abatida pela tristeza, a mulher também morreria.
Nenhum deles suicidou, segundo o relato do antropólogo.
Darcy registra, documenta, realça uma bela história de amor de um homem, uma mulher e um menino. Uma história da vida e da morte.
Ele toca nossos corações. E sabe como fazê-lo.
O antropólogo não mente, ele registra, destaca a vida feliz deste povo que ele ama.
E a vida de Darcy?
Amores, muitas mulheres, muitas paixões, muitos momentos, momentos fugazes. Observo Darcy fazendo seu relato e devo documentar que o Darcy que conheci expandia felicidade. Era um homem feliz, navegando no mundo a seu modo, amando as mulheres a seu modo. Teria sido realmente feliz o homem Darcy? Eu acredito que sim. Sua grande tristeza existia... diria que sua tristeza seriam as suas derrotas, mas as suas derrotas ele as valorizava, “melhor estar do lado dos derrotados do que do lado dos vencedores” quando se luta pela justiça e vence a injustiça, quando se luta pela liberdade e vence a opressão, quando se luta pela independência de um povo e vencem os ditadores.
Não havia derrota e nem tristezas para Darcy, havia a luta que nunca o abatia e todas as alegrias da vida bem vivida, cheia de bons momentos e da coragem de amanhecer. Darcy amanhecia de bom humor. Nunca dentro dele morreu o menino de pés descalços das ruas quentes de Montes Claros.
No documentário, ele destaca ainda a memória de um sábio dos Caapós capaz de dizer uma árvore genealógica, pontuada de histórias, de centenas e centenas de nomes, “dizia de baixo para cima e de cima para baixo” e por partes, separadas, de acordo com a intervenção do antropólogo. Mostra a produção das roças de mandioca e o processo de preparação da farinha. Insiste mais uma vez na importância do conhecimento da culinária. Na educação de um homem, ele deveria saber
1. ler,
2. escrever,
3. contar e
4. comer.
Assim, enfatiza o conhecimento básico para a sobrevivência de todos nós.