Tantos Vírus
Eurico Mendes
Contrai uma doença chamada tristeza
Transmissível
pela tristeza de um filho
Hereditária
pela perda de uma mãe, de um pai,
um tio, um avô
Uma doença que chega
pelo olhar triste de uma criança
Ela se espalha como uma epidemia
quando o time perde um campeonato
Entranha-se nos sonhos
perde-se em terrenos baldios
cúmplice de vadios
mistura-se em muitas alegrias
até na mais triste de todas as alegrias
a alegria do palhaço
traiçoeira como a jiboia
que pula encantada
num golpe mortal
na garganta do encantador de serpentes
A tristeza é uma doença contagiosa
prolifera-se numa vida boa e a devora
Destrói como uma praga ou uma
peste
espalha-se como erva daninha
Engana a alegria
pede uma vida extensa, quer mais
entra por portas fechadas,
sem explodir cadeados
A tristeza não é alegria
engana aos poetas que seduzidos
entram vadios atrás de seus cantos
e de seus encantos, fazem-nos
morrer por um momento
a eternidade.
Amor perdido e dilacerado,
tristeza, que traça meus passos
nesta cidade de muitas árvores,
árvores de tantas folhas,
de ruas de muitas casas e cores,
prédios de muitas janelas e almas,
cimento, puro cimento, corroendo,
trancando, fechando, silenciando,
os gritos felizes dos amantes e
as tristezas saem vestidas de azul,
amarelo e de branco, em panos
cortados e em metais luminosos.
Triste.
Muitas tristezas
Muitas tristezas
sempre choram
todas as alegrias perdidas.