terça-feira, 20 de maio de 2014

NADA NADA NADA










UMA VIDA PARALELA 


Tomás Abujanra




Para Valda Vallejos, de Caracas, Venezuela







Como uma única folha caindo em plena primavera

Como na brusca tarde em que o sol dourado


                                  embranqueceu, empalideceu


                                  completamentando o fim


Como o corpo amante se afastando 

do corpo amado

Como a agulha e o burro do camelo 

imaginando passageiro

Como um barco submerso pousando 

lento no fundo  

Como o grito da carne rasgada 

e do filho surgido  

Como o espelho que reflete 

mil espelhos eu vou   



                                   colocar a imagem daquela mulher 


na história

  

                                    mulher que me pertenceu pedindo 


outonos na


primavera  



                                    o impossível de juras eternas 


de um nunca abandonar  



Dito com palavras que nada significam   

Submergindo lentamente nos meus carinhos   



Sofrendo em cada ato a descoberta   

de imagens sucessivas 

de crianças nossas iguais


Mulher que me pertenceu 

como alma em outro corpo


Mulher que viveu tanto em mim 

e do que extraia de mim


Hoje, distantes tantos quilômetros,


é verdade a alegria


de verdade



Ontem, sozinho vi-me em apuros


E se daqui a mil anos  


um encontro  


eu não saberei nada nada nada


porque tenho comigo guardada


a esperança da vida


como o mar   


como o inferno,


como a luta





Se eu chegar até você e você

Não se assemelhar àquela mulher    

sequer igual às feições guardadas  


Ao desviar-me de ti

Ao perder-me de ti



Acontecerá, então, tudo de novo?


- Desconhecidos, somos desconhecidos


- Eu não conheci você e você não me conheceu.