sábado, 18 de outubro de 2014

MATHER

A hora da identificação: Quem é Zenila?




 A menina Zé na casa de Naná


(Um mundo pelos olhos de uma menina de 13 anos, 

em Belo Horizonte, na década de 30 do século XX)



Josias Barbuda







- Conheci Nonô na casa do dr. Júnio Salvador. Nunca imaginava



- Chegou e pediu para passar um terno azul


- Nonô era o irmão de dona Naná, mulher do doutor Júnio. Chegava ele e Sarita. Dona Sarita, mulher de Nonô, era uma mulher muito feia. Tinha os dentes encavalados. Sentavam na nossa frente para tomar café.


-  Naná era doente.

- Cocainômana?

- Diziam

 - Ela ficava olhando pela janela fechada. Ela abria a cortina assim, puxando de lado. As pessoas pediam informações sobre quando podiam falar com ela

“Hoje, pode falar com ela”.

- Não era todo dia.

- Naná ficava, muitas vezes, sentada, conversando com o doutor Júnio.

- Ele segurava a mão dela. Ali, ficavam horas e horas. Ali, num canto, os dois conversando.


- Naquela época conhecíamos o Nonô apenas como doutor Juscélio, irmão da dona Naná.

- Foi o Júnio quem pôs o Nonô na política. Júnio Soares fora chamado para ser o administrador e indicou o cunhado.

- Júnio era preguiçoso, diziam. Era o que diziam. Não era verdade. Eu percebia que ele jamais abandonaria, em instante nenhum, a sua Naná.

- E tinha mais, doutor Júnio gostava da clínica. Gostava da medicina e parou de clinicar depois da morte de uma jovem freira do Sacré Coeur, uma freira portuguesa que morreu com 22 anos. Ela com uma crise grave de apendicite e informações de crises histéricas anteriores, teve o diagnóstico tardio e morreu. Disseram na época que, embora raro, o apêndice da freira era do outro lado do corpo e isto enganou o médico.


- A partir deste episódio e da assistência a dona Naná, o doutor Júnio foi reduzindo sua atividade clínica. Talvez, por isso diziam que ele era preguiçoso.

- Maria e Bela, as filhas do doutor Júnio, eram mais bonitas do que dona Sarita.

- Hoje, Bella está gorda e velha.

- Eles me buscavam sempre no Sacré Coeur para passar os fins de semana. Júnio era muito amigo do Juca, meu pai.


- Eu ia para a casa deles aqui na avenida Paraúna, hoje avenida Getúlio Vargas. Ou então íamos para a casa da Pampulha.


- Lá na casa da Pampulha vi pela primeira vez um aspersor molhando a horta. Maravilhada, passava horas vendo aquilo, a água voando, as cores e as plantas ganhando cores.

- Íamos para a casa da Pampulha em ocasiões especiais.

- Uma vez, numa festa de São João, na casa da Pampulha, pegaram o doutor Mendes beijando a dona Sarita.

- As meninas, nós todas, queríamos saber dos detalhes, da verdade, seria ou não verdade, quem viu, como as coisas aconteceram. Uma conversa que não terminava.

- Depois, outra: Nonô pegou a Berila.


- Beila era mulher do doutor Mendes. Mendes de Souza era irmão do doutor Petrônio.

- Mendes era um homem muito bonito como o doutor Petrônio. No casamento de Berila com o doutor Mendes, um avião despejou pétalas no percurso entre as duas igrejas. Eles casaram na igreja católica e na sinagoga. Ela era judia..


- As sobrinhas, Maria e Bella, perguntavam ao tio Nonô o que ele vira na Sarita. Ele, segundo elas, tão bonito, e a Sarita, tão feia. O que o tio viu na tia, perguntavam como um código entre os três. Mas Nonô era feio. Tinha presença. Isto encantava as pessoas, homens e mulheres. Um homem alegre e feliz, sempre feliz.

- Nonô passava muito tempo na casa de Naná, conversava, ouvia as pessoas e ouvia muito o doutor Júnio.


- Era uma pessoa diferente. Ele via os outros, gostava de gente. Ele ouvia e gostava de ouvir música também.








Nonô e Naná