segunda-feira, 14 de março de 2016

NENHUMA SURPRESA








 A Performance 


Ítalo J. Conrad



Silêncio e madrugada A nossa rua é uma rua silenciosa à noite. Na madrugada, há quem garante que ouve as pancadas dadas na cama do andar superior, pancadas pelos movimentos ritmados de corpos. A rua é estreita, mão única, no morro, descida do Alto do São Lucas. De um lado, no quarteirão, doze prédios de três andares, dois de cindo andares, andares a mais, permitidos pela inclinação do terreno. O prédio fica rodeado de prédios, na frente, atrás, dos lados. É uma rua tranquila, principalmente à noite.


Os gemidos do orgasmo Na madrugada do dia 13, o professor Onofre Almeida Braga, da faculdade de Direito, lia a tese do doutorando de Amadeu da Luz (*), quando ouviu gemidos de uma mulher no orgasmo. Olhou no relógio 3h40m. O orgasmo durou quatro, cinco minutos. De onde viriam aqueles gemidos? Podia ser do prédio de frente como podia ser de um dos prédios laterais pela posição da sala de estudos do professor, como poderia ser de um dos prédios da parte de trás.


Orgasmos em sequência alternada Nem dez minutos depois, 3h55m, recomeçam os gemidos e pela frequência de sons seria da mesma mulher. Isto se repetiria outras três ou quatro vezes. O número de orgasmo da mulher seria controverso. Uns diziam que foram cinco, outros seis, outros quatro. Quatro ou mais de quatro, com certeza afirmava o síndico Augusto Penaforte, aquele mesmo que vivia animado com a relação “familiar” que mantinha com “o marido da minha mulher”. Um homem civilizado, dizia ele, que sempre, nos elogios ao marido da sua mulher, acrescentava tratar-se de um grande pai de família, um bom amigo e um companheiro de buraco – se referia ao jogo de cartas.


whatsApp em ação Em torno de quatro horas, os amigos e colegas do professor Braga, vizinhos e amigas, acordados pela fabulosa sequência de orgasmos daquela mulher, apostaram que seriam capazes de identificá-la “ainda hoje”. As mulheres que entraram no whatsApp observaram, sem nenhuma cautela, perante os maridos, que melhor seria identificar o homem, autor daquela proeza. Todos concentraram, sim, em apontar a façanhuda.



Círculo fechado Naquele dia, ninguém conseguiu. Limitaram a área a três prédios, o de frente, o próprio prédio e um prédio dos fundos.


Redução de indícios Duas mulheres passaram a ser observadas depois que eliminaram mais de dez, entre casadas e solteiras. Estas duas eram solteiras.


Fecha o cerco Um mês depois, nada. Nada. Nada. Até que um nova rodada de orgasmos às seis horas da manhã mobilizou todos os celulares e, ao cruzamento de mensagens, decidiram sair para a rua e esperarem em seus carros para ver quem sairia do prédio ao lado. Era do prédio ao lado que vinham os gemidos, mais precisamente do segundo andar. Já sabiam quem morava nos dois apartamentos daquele andar.


Experiência é tudo Confirmaram as suspeitas do Leonardo, corretor, “nenhuma mulher goza tanto assim se não tiver mais de dois parceiros, é suruba, ou...”

- Eram duas mulheres, a Djanira, doutora Djanira, e a sua cunhada Maristela, enfermeira, que mora no segundo andar do prédio do lado.

Doutor Braga conclui

- São duas línguas ardilosas, competentes e insaciáveis.

Conclusão com jurisprudência estabelecida.









(*) O Assalto Midiático e o Assalto Jurídico. A destruição da Democracia. Tese de doutorado de Amadeu da Luz, orientador professor doutor Onofre Almeida Braga.