Nasce um novo século
Quando o tempo é criança
Afonso Henrique
Hoje
é sábado.
Acordei
cedo, depois de ter despertado algumas vezes de meia noite às 5h30m.
Acordei quase seis horas.
Ainda
escuro, já pronto para sair.
Fui até a sala.
Voltei ao quarto.
Fui até a sala.
Voltei ao quarto.
A
mãe amamentava.
A
beleza da cena prende a minha atenção.
As
duas estão na cabeceira da cama, abraçadas – o amamentar é um abraço, um afago,
é o carinho perfeito.
A
mãe, pernas descobertas e a filha concentrada no peito esquerdo, mamando.
No
final da noite, no silêncio, na penumbra, os movimentos são lentos, leves e
suaves.
Paro.
Observo
as duas. Sento aos pés da cama.
A
mãe estende as mãos. Ela me quer mais perto. Sento sobre o seu pé direito e
acaricio aquelas duas meninas. São de fato duas crianças.
Pelos
gestos da mãe, não deveríamos acordar a criança.
Ela dorme
concentrada no mamar.
A
mãe protege-a com a mão para impedir que, um movimento, a desperte.
O
movimento que a mãe faz é para observar-me.
Acompanhamos
a mamada.
O
ritual é o ritual do silêncio e de gestos cuidadosos.
É
inútil o esforço para mantê-la dormindo. Algo que não era o movimento e nem o
barulho a acorda.
Inútil aquela
pequena pequenininha criança acorda.
É
sempre assim. Ela percebe-me.
Ela
acorda, larga o peito, volta-se toda para mim e sorri.
Isto
é a felicidade. Isto é ser feliz.
É um
momento de grande felicidade. Total felicidade. Ouro puro.
Quieta,
ela espicha-se com delicadeza.
No
quarto, na cama, no silêncio do final de noite, aquela pequena criança, a mãe e
eu.
Nós
três, sozinhos e o silêncio.
Os
olhos delas, sonolentos, sorriem.
Ela
olha-me, olha para a mãe, sorri, mais uma vez, e volta a mamar.
Deito
ao lado das duas, cochilo.
A
mãe tira meus sapatos, minha calça e a camisa.
Deito
outra vez e durmo outras três horas.
Assim
começou este meu sábado.
É o começo de um novo século.
É o começo de um novo século.
E eu
sou um homem feliz.
Final de 1999