segunda-feira, 16 de abril de 2018

NA VIDA


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A vida abandonada




 Rufino Fialho Filho






Clara largou Emerson e levou os dois filhos, um menino de 16 anos, filho de outro homem, e uma menina de 9 anos, filha do Emerson.

No dia em que ela foi embora, ele começou a chorar. Agora já são dois meses de choro, 60 dias de olhos inchados e de desespero para Emerson.

Quem primeiro ficou sabendo foi Paulo Rodrigues. Ligou. Emerson não aguentou conversar. Preocupado, Paulo acionou dois amigos de Emerson. Deviam fazer algo antes que as coisas piorassem.

Emerson já teve dois enfartes e um derrame, não aguentaria uma depressão e nem um descontrole com álcool e alimentos gordurosos. Clara teria colocado Emerson para fora de casa.

Paulo Rodrigues ligou também para Clara e retornou para os amigos, “não tem jeito, ela está firme e não volta mais”.

Pobre, sem dinheiro, com dívidas, seis meses de aluguel atrasados, a agência de publicidade fechando, Clara foi trabalhar com Cláudia ganhando 2.500 reais por mês. O dia do pagamento, ela agiu na surpresa: saiu de casa.

Na versão dela, o ambiente não estava bom por causa das dívidas e mais ainda devido às brigas e agressões de Emerson a ela e aos dois filhos dela.

Ela foi morar na periferia num barracão nos fundos da casa da mãe de Vilma, a mulher que dá apoio à separação do casal e que as conversas de botequins identificam como a nova amante de Clara.

 – “Mas Vilma não é casada? O marido dela é virtual. Ela sempre gostou de ralar coco com coco. Preste atenção na masculinidade da Vilma. Ela sempre foi homem, um homem de voz adocicada e sensual para capturar as mulheres, meu amigo”.

A solidão colheu Emerson de chofre, morando na casa da mãe, com 84 anos, os dois estão sozinhos nos finais de semana.

A velha já estava sozinha há muitos anos.

A cena comum agora é ele deitado, bêbado, chorando e ela chorando em cima do filho. Juntaram as duas solidões.

Solidão e solidão se juntam?

O assunto do Emerson é a sua vida e falar mal de Clara. Uma mulher de nível diferente do seu. Ninguém da sua família concordava com aquela união. Não daria certo, nível diferente. Ela uma funcionária da faxina da sua agência. Ele o patrão. Ela analfabeta. Ele um profissional de criação, vitorioso, premiado, ganhando um bom dinheiro.

Ele gosta dela. E todo mundo diz isto repetindo a declaração dele.

Sua filha com a Clara está passando necessidade, diz Emerson. Ela levou minha filha para morar num lugar horrível. Lá está faltando leite. Vilma que havia garantido um salário de 2.500,00 reais para Clara, agora só paga 750,00 reais.

No período de trabalho de Clara com Cláudia, no Sesc Venda Nova, mais de 500 mulheres e mais de 100 homens se reuniram durante duas semanas na mais intensa trepação, “quando Cláudia reúne prevalece o sexo, é o sexismo da Cláudia, você sabe muito bem disso, e lá as mulheres disputavam os homens e comercializavam, era um homem para cinco mulheres”.

Clara estava lá e ali a vida da Clara ganhou rumo, depois disso ela se declara livre e desimpedida.

Ontem, ela ligou para ele e agradeceu tudo o que ele fez por ela. Liga quase como para uma manutenção de esperança ou de dependência.

Liga para saber se a corda está tensa, para ouvi-lo submisso, para sua satisfação, lembrando-o da sua liberdade e vida sem compromisso, da sua disponibilidade.

Vilma diz que Emerson explorava Clara e que a vida deles estava um inferno. Diz que Emerson não está sofrendo nada não, que tudo é fingimento, que ele não tem nada, que está bom, que é mentiroso.

Carlos, o presidente da AMS, diz que Emerson e Vilma deram um tombo na SMA, que Emerson brigou com Carline, o jornalista que ele queria levar para lá, “foi grosseiro e me deixou numa situação delicada”, que Emerson nunca fez nada direito, que sempre errou nos trabalhos feitos para ele.

A versão da vida comum da Vilma com a Clara tem prevalecido.

Emerson continua chorando.

Pensa e fala em suicídio. Busca apoio de pessoas que possam ouvi-lo, frequentando reunião de empresários em maus lençóis e que leem a Bíblia e depois relatam suas desventuras.

Ontem, ele foi a uma reunião espírita onde se discutiu o controle das emoções e a construção do conhecimento pessoal que possibilitaria estabilidade às vidas e um crescimento emocional, “se discutiu também o QI e o quociente emocional”.

Depois, ele recebeu um passe dado pela mulher que dirige o Centro Espírita e que é a guia espiritual e médium: a Maria Helena. 

Ah! Ah! A dona Maria Helena, cujo marido não suportou viver com ela e que pulou do trigésimo andar.