Àquela
mulher
Otto de Albuquerque
Como
uma única folha caindo em plena primavera
Como
na brusca tarde em que o sol dourado
embranqueceu,
empalideceu
completamentando
o início da noite
Como
o corpo amante se afastando do corpo amado
Como
a agulha e o burro do camelo imaginando passageiro
Como
um barco submerso pousando lento no fundo
Como
o grito da carne rasgada e do filho surgido
Como
o espelho que reflete mil espelhos eu vou
colocar a
imagem daquela mulher na história
mulher que
me pertenceu pedindo outonos na primavera
e o
impossível de juras eternas de um nunca abandonar
Dito
com palavras o que elas não significam
Submergindo
lentamente nos meus carinhos
Sofrendo
em cada ato a descoberta
imagens
sucessivas de crianças nossas iguais
Mulher
que me pertenceu como alma em outro corpo
Mulher
que viveu tanto em mim e do que extraia de mim
Hoje,
distantes tantos quilômetros, vejo como é verdadeira a alegria
Ontem,
sozinho vi-me em apuros
E
se daqui a mil anos
um
encontro
eu
não saberei nada nada nada
Tenho
comigo guardada a esperança da vida
como
o mar
como
o inferno,
como
a luta
Se
chegar até você e você
não
se assemelhar àquela mulher
sequer
igual às feições guardadas
Ao
desviar-me de ti
Ao
perder-me de ti
Acontecerá,
então, tudo de novo?
Desconhecidos,
somos desconhecidos.
Continuaremos
desconhecidos