Coração mole
( minha mãe já dizia)
Maria De Lourdes Giannetti
A máquina fria
indiferente
me inspeciona o coração
Espreita seus movimentos
conta seus batimentos
deixa um traçado irregular
no papel
como irregular é tudo que escrevo
e irregulares são as linhas
da vida
A máquina conta uma história
mostra
imagens
antes inimagináveis
numa tela de cinema
disfarçada de ultrassom
Um filme assustador
- é terror, será amor?
grandes momentos
quase explosão
Meu coração, essa bomba
autônoma
cheia de si
como criança mimada
não escuta meus apelos
sou eu quem ouve assustada
cada batida apressada
o ritmo alucinado
desse tambor
O que leva o meu amigo
tão antigo
a se afligir assim tão fácil
com tal ímpeto?
quer se mostrar todo inteiro
Meu coração companheiro
não sei como ele é
será vermelho, arredondado
perfeito no seu aspecto
bem cuidado
como um desenho
uma maçã?
Ao contrário
imagino sua cor
de um castanho apagado
seu formato retorcido
como fruta ressecada
Meu coração ofendido
constrangido
com tão rude
opinião
chora na
sua dor
e vem parar na minha mão
que
o acolhe e reconhece
sua beleza
escondida
bem guardada
construída
numa
vida
tão vivida