Até a mulher,
até o rio
e o amor
Rufino
Fialho Filho
Senti
que minha pele se tornou um musgo
tenso
e nervoso
desses
que vivem junto às poças
nas
poças,
eu
próprio uma parede sombria
Para
se chegar até mim
precisará deixar o sol
penetrar
a umidade
Quem
me ama faz analogias
com
um vestido de tafetá
Meu
presente da natal para ela
-
Eu um lugar no mundo
preciso
e identificado
habitante
de um espaço
e
o próprio espaço habitado
Um
espaço animado e sombrio
triste
e vagabundo,
alegre
e sem brios
Vieram
me dialogar, numerar
Distribuir-me
perigosos para todo o país
-
Quais são as suas propriedades?
-
Tudo porque sou um dos poucos
-
Senti e percebi ao tocar-me: o sol saia de mim
Meu
corpo perdido, sem espaço, era luz-objetivo
Chegaria
até o milharal
Fazê-lo-ia
brotar
Restar-me
como energia do milho
Percebi
muito mais.
Por
exemplo, vi por trás
de
um sorriso
grande
tristeza bronzeada
Veio
o mar bater na parede da casa
em
que durmo. Atreveu-se a aproximar-se
da
minha rede.
Levantei
e dei-lhe um chutão.
Com
medo, o covarde correu para se juntar
aos
outros mares.
Com
medo do medo do mar,
apanhei
minha rede e fui
estender-me
mais distante
naquela
alta montanha verdejante
Vejamos
agora.
-
Deixei a toalha secando na areia,
o
mar levou
-
Deixei a menina queimando na areia
...
não, não foi o mar quem levou
-
Deixei meus sonhos amontoados numa barraca na areia.
A
brisa levou, sonho por sonho, grão por grão
-
Praia de Macapá
pequenininha
Do
tamanho, não maior,
da
babaca de Graça
-
No meio do rio
a
maresia
joga
para o alto
joga
para o alto
a
canoa/a gente
De
repente,
a
canoa da frente
se
alia ao rio.
Traiçoeira,
joga
para o alto
Joga
gente para o alto
Joga
para dentro do rio
Pressa,
desespero.
Tirem
da água
a
mulher aflita
e
o filho morto
preso
no abraço
amoroso
pavoroso
Sobem
a mulher e o desespero
Até
hoje não sei
se
a mulher chorou
se
eu chorei
se
todos choraram
-
A mulher olhou, infinitamente, para o rio
Voltei
a ser um musgo tenso e nervoso
a
viver junto às poças.
Eu
próprio, a parede sombria.