quinta-feira, 5 de novembro de 2009

DEPOIMENTOS DO CÁRCERE



Carne e osso


Senti uma mão procurar a minha. Todos tinham as mãos estendidas no chão.

Era a ordem. Éramos dez e todos encapuzados.

Estávamos sentados ao longo da parede fria, muito fria.

Parede indiferente à sorte de todos e dela.


De repente, aquela mão rastejou ao longo do chão e da parede fria - indiferentes.

O chão, também indiferente a todos e a ele.

Aquela mão menor do que a minha rastejou para o meu lado.


Alguém mais do que eu precisava de um gesto.

Era a lenta e desesperadora procura de torturados!?

Tornara-se humilhante quaisquer fuga ou medo.


Era santo um “agüente firme, companheira”.

Identidade que se expressa, com toda a força possível, em um aperto de mão.


Risco total.

Poderíamos sofrer novos vexames. Novas torturas.

Quando nossas mãos se encontraram, nossos braços estavam totalmente estendidos.


Apertei, com força, a mão trêmula, fina, fria não como a parede,

não como o chão.


De meus lábios sangrados não foi possível impedir

o som rouco da dor e da esperança.


Havia de escapulir aquele grito de protesto

e de protesto para confirmar o gesto?


Repeti o que venho insistindo comigo mesmo para ser forte,

o mais forte que pudesse, sem ceder um milímetro.


O gosto da madeira e do meu sangue entraram

com violência dos meus lábios para a garganta.



Um peso incrível despejou-se sobre nossas mãos, como se fosse uma massa de concreto.


Não houve tempo para o grito ou a dor.


Nossas mãos foram destruídas.