Ele só
chorou
Juarez Andrés
Cauê,
um fila, jovem, bravo, faminto, avançou duas, três vezes em Helga por causa de
comida – nunca era o suficiente (*) para aquela fera em crescimento.
Cauê sempre avançava para tomar algo, comida
sempre.
Uma
vez a arrastou da sala até a cozinha e ela sempre se livrava jogando um pedaço
de pão para ele. Somente assim a largava para buscar o pão.
A
agressividade aumentava sempre (sempre a comida era insuficiente).
Cauê
mordeu barriga, seios e braços de Helga. As marcas espalhavam-se pelos braços e
ombros. Algumas cicatrizes ficaram.
Helga
teve que ir para o hospital várias vezes e, da última, ficou claro o risco que
se corria.
A
mordida no braço por poucos milímetros não atingira a veia.
Com
o tempo, Cauê muda e é já um animal integrado com as três pessoas da casa.
Duas
pessoas sempre presentes, Helga e Boni na relação direta de alimentá-lo e a MV,
a Mulher que Voava, comissária de bordo passava dias e semanas inteiras voando
por todo o mundo.
Com
ela, Cauê reconstituía a memória rapidamente, porque o carinho e a atenção
vinham sempre acompanhadas de um pedaço de pão.
Cauê
já percebia a chegada de Boni, identificava o cheiro, o som e algum outro
indício só capaz de ser percebido por um cão.
Isolado
na parte de trás da casa, a mais de 50 metros de distância e a qualquer hora do
dia, mesmo com o intenso movimento da rua, ele identificava a chegada do carro
de Boni antes dele abrir a porta da garagem..
Só
parava de se manifestar depois que Boni gritasse o seu nome.
Depois
chorava e só parava após os dois se encontrarem ou se verem.
O
seu olhar para o amigo Boni era intenso e Boni admirava sua força e a rapidez
dos seus movimentos.
Ele
o obedecia.
Ontem,
sexta-feira, Helga ligou. O Seu Coelho chegara para levar Cauê.
Cauê
tomaria conta de um sítio.
Seu
Coelho queria um cão bravo para substituir um outro que havia morrido.
Cauê
ficaria preso a um arame até se acostumar com as pessoas da casa em Santo
Antônio do Monte.
“Ele
deixou que eu colocasse a focinheira. Cauê apenas chorou”.
(*)
Período de vacas magras, comida regrada e bancada pelo sacolão do Centro