TRISTES
LEÕEZINHOS
Sheila conversa com Valente. Queria conhecer aquele
outro homem, Arthur. Cada vez mais, no entanto, viu-se enlaçada nas
malhas, nas armadilhas e ciladas de um suposto valente.
Pressentiu o labirinto. Decidiu avançar. A
curiosidade abre ou fecha caminhos. Arriscaria no labirinto.
Se ela tivesse sua maquina, fotografaria aquelas
mãos firmes de um homem de mãos firmes. Aquelas mãos segurariam os seios desta
mulher volumosa e eliminaria a timidez dos modelos.
Ele não passara daquele copo de uísque e o copo
continua cheio.
Sheila fotografaria aqueles olhos estranhos, aquela
presença sensual. Ela foi ao banheiro ver se chegara a menstruação.
Sheila entendia que deveria levar Valente para
adorná-lo com as suas pernas na pose número V e I. É a vontade de ter e apertar
o rouxinol em sua mão. Pássaro capturado em suas leituras do Decamerão, de Boccaccio.
Ela ofereceria seu corpo nu aos trabalhos dele.
Sheila nunca antes estivera tão perto de um homem com
tamanha lucidez manual.
Aparentemente lúcido.
Ela enrubescia com olhares rápidos. Ora aqui no
ombro ora na bunda. Enrubesce-se por vergonha e por prazer e era com a
sensação de estar sendo possuída que Sheila ruborizava-se.
Ele compreendia os seus desejos... Pensou.
Se ele lesse seus pensamentos, se ele interpretasse
estes sinais, era porque o próprio corpo dela a denunciava.
Ela também quer que ele saiba tudo o que ela pensa
e que se concretize tudo. Viu novamente as imagens das mãos firmes fotografadas.
O flash.
Ela se sentiu como se fosse o modelo. Sentiu pegada
por aquelas mãos... ali, na frente de todos... e esporrava-se.
Inquieta levou a mão aos seios. Os mamilos estavam
duros. Ela tremeu. Dele veio o sorriso. Cafajeste! Um dos seus rápidos olhares
percorre-a para dizer que se reservasse para uma meia hora mais tarde.
- Meia hora? Trinta minutos? Ejaculação precoce?
Sheila perguntou-se o que naquele homem tanto a
interessava. Ele era velho? Era velho. Não, não era. Parecia. Não era.
Se ela colocasse-o ao lado do primeiro marido,
batata, preferiria o marido, por mais estulto que o este Arthur fosse. Ela
esgotou-o. Ele fugiu apavorado. Ela gostava de homens que durante o dia
continuassem a noite. O primeiro estourou. Plum. Atônita. Pulverizou-se.
Valente era um dia que carregava a noite dentro de
si. Não é que ali naquele restaurante ela se sentia possuída?
Agora, ela mistura Arthur com Valente.
Ele é noite e dia.
E ela agora? Assustou-se. Ela perderia a fome.
Sentir-se-ia saciada. Mas ela cultivava a insaciedade.
Diante de algo desejado, uma noite inteira assustava. Tremia. O medo não tem forma.
Sheila passou as mãos nos lábios, acariciava-os levemente.
De repente, assustada, atirou as mãos para longe
dos lábios. Suas mãos eram as mãos de Valente.
Olhou. Eram finas e longas. Sheila havia bebido
muito. Ela queria que um homem a abraçasse (Valente).
Dormira duas noites com John, dormiu apenas e ele
já se considerava dono. Foi bom Valente aparecer. Afastou John. Afastou John
sem queixas. Seus vinte anos eram belos, sua pegada era firme, consistente.
Sheila sentia-se bela com a sua mocidade, a sua
pele jovem. Os EUA estavam longe. Estava longe a sua casa, llinois, Adan,
o primeiro, Hugh, o segundo, seus pais, a igreja, as quadras de tênis.
Ela não reclamava, nada disso; seus esportes, sua
religião, sua família, seus maridos, seus amantes, seu estado. Sua pátria era a
cama.
Arthur manjou a jogada de Valente em cima da loura,
loiríssima, louquíssima Sheila; agora, aguentasse o saco, aguentar e conversar
com seus diplomatas de restaurante, rir das piadas desse cavalo-do-mar, Paco,
saco, Paco, e se ele bobeasse, acabaria de mãos no bolso. Fique com o que lhe
resta.
O negócio é ficar com essas coxas estruturais que
atende por Mary, made in, make in, como são amáveis os diplomatas, as
diplomatas! Cedem-nos suas bucetas como nos passam cigarros. Campo aberto.
Valente avançou, eles retiraram-se ordenadamente.
Ideia de jerico essa de passar na praia. O homem-cavalo-do-mar anda com
trapaça, ah! Meu saco, Paco. Valente segurou mesmo aquela buceta. A putinha é
toda dele.
Irmãozinho, amanhã chuta essas coxas para mim,
chuta?! Um chute de categoria, Sheila! Olhem só aquela cabeça de conhaque!
Filha da puta de dengosa vem chupar meu cacete, lourinha, loirinha, louquinha.
Em que estou pensando? Na lourinha chupando. Não me incomoda, Mary.
Meu pensamento não vale nada. Numa hora dessas,
penso nas eleições. Quando é que o homem pensa na vida política, antes, durante
ou depois da vida da cama? Escutava as historias dos gringos. Gringa quer dizer
que você conhece o Brasil (um país lindo, lindo, acabou. Tem belas praias
também, não?). Ela conhece o oriente e o Vietnã, que buceta viajada, nunca
pegou uma gonorreia no dedo do pé, Mary is coxas, ah!
Já? Gonorreia nos olhos e no cu, putinha linda, vou
fazer umas fotos – nus artísticos, eu sou artista, e distribuir para os centros
de FTI (Fodas Telepáticas Internacionais.)
Fodam uma americana e ganhem: três bicicletas, dois
rádios de pilha zero quilometro, uma caixa de bombons, uma lata de quitute e
uma consulta ao psiquiatra.
Mary is coxa. Mary, eu não estou
bêbado. Não gosto de desodorante. Prefiro uísque. Molhe uísque no algodão.
Coisa linda. Mary, pena você não saber português, Brasil.
Quod Salamanca nom dat, natura non praesta.
Gide diz que a lucidez... Porra esqueci, é algo de
lucidez, embriagues, deixa pra lá, façamos nossa própria ideia, quando estou
bêbado estou tão lúcido, ou mais, nunca menos, do que quando não estou bêbado.
Estou mentindo? A lucidez não seria um estado de
embriagues? Quando o homem se sente lúcido, ele não se sente num estado
diferente do estado normal?
Entonces... queridinha, made in lit, lit é, sabe
porque o homem chama as mulheres carinhosamente de galinhas?
No Egito antigo... Olha filhinha, eu sou aquela
revista, você sabe por que...? patati patatá. Você sabe por que o homem fode e
a mulher é fodida?
No seu país também tem disso? Ah é verdade. Os
romanos dos séculos vinte. Sabe, filhinha, sou um pai frustrado.
Sabe, filhinha, eu gostaria de viver num período de
decadência, ser um homem libre, ser um homem puro, ser um homem bom, período de
decadência, por quê?
Poxa, devem ser os momentos de mais criatividade da
historia, momentos saborosos, momentos em que os homens são verdadeiramente
livres e em que as mulheres se tornam as partes pudendas, partes santas.
*
Os brasileiros são as melhores pessoas que existem.
Cavalheiros de uma década de muitos séculos.
Eu, Paco Hernandez, posso dizer isto. Sou argentino
e em minhas veias correm sangues judeu, alemão, negro, espanhol, americano e
brasileiro. Tudo registrado em anos de aventuras marinhas, a la Jack London,
sem chamados selvagens nem latidos perdidos.
Eu, Paco Hernandez, posso dizer isto porque conheço
um povo que vive do paralelo x ao paralelo y, amando o sol, um povo que sabe
rir, um povo que tem humor e dignidade. Um povo com a força da alegria.
Eu, Paco Hernandez, conheço este povo que trabalha
nas salinas, nos portos, que anda apressado, eu conheço este povo, eu posso
falar que amo os brasileiros, eu conheço tudo o que é bom, e bastante do que é
ruim.
Conheço, definitivamente?
Não conheço.
Eu, Paco Hernandez, homem e navio, eu conheço o
povo brasileiro, eu sei que ele vive em morros, eu sei que ele morre nas picadas,
eu sei que ele é um povo tolerante. Conjunção importantíssima.
E agora? Paco! Ô, Paco! Oi! Você criou um caso
internacional. Estas gringas vão sair com o Valente, Valiente, teniente,
serpiente, sacana.
Vai levá-las para aquela casa do diabo, vai derrubá-las,
sacaneá-las, fodê-las e depois passar cola nelas. Elas vão tornar-se rondantes,
sentinelas da madrugada. Viverão em torno daquela casa como mosquitos em volta
das luzes. As mulheres de Valente desesperadas, consolam-se facilmente. Vou
deixar os dois pegarem estas. Daqui a dois dias eu pego uma na rebarba e a
outra na esquina.
Bom é apalpar o terreno. Que bunda, Mary! Que
bunda! Como é que você conseguiu tanta carne, gatinha? Mary você não é bobinha.
Essa, Arthur, vai se foder. Mary você é ronca-couro.
Dar, dê uma chave de rins e não deixe o sacana pular fora.
Foda-o. Depois caia mansa neste colo de mãos no
mastro para não afogar. Mary você é um animal doméstico. Não adianta mostrar tantas
garras. Há uma cadeira dentro da sua boca.
Valente escuta as conversas. Ligou todos os
microfones do seu gravador. Estava no carro de Paco.
As cores corriam junto com o vento. A tarde
esquentava. Os edifícios brancos, as praças limpas, Montevidéu é uma cidade
tratada com carinho. É linda e carinhosa.
Deixaram os americanos no bar discutindo a
educação. Quan-tas-horas? Quatro para acabar a praia. Entonces, vamos a
passear. Passeavam de carro pelas praias e agora se dirigiam a Pocitos.
Queria ver o sol e as pessoas nas praias, as cores
e o vento nas ondas, a pele queimada e os jogos na areia. Queria ver o sol e as
pessoas embaralhadas. Mary faz pose. Sheila fotografa.
Paco distraía as americanas com as suas
fabulosas-mentirosas aventuras nos mares e terras ao sul. Ao sul de tudo, ao
sul do paralelo 20, ao sul do amor, ao sul dos seios, ao sul das lutas, ao sul
do frio.
Elas riam e abandonavam o carro pela imaginação
exótica/erótica de Paco, alto, equilibrando, cai não cai, no alto duma vigia,
no leito de um mar furioso.
Ele viu a natureza brava. A raiva em ondas. O ódio
molhado. Ele viu o quanto era fraco.
Valente sentiu as mãos de Sheila, mãos leves,
apertando-o. Pocitos logo ali. O carro corria.
O Oldsmobile roxo da GM freia.
Descem no começo da praia, próximos de uma pedra
que entrava ao lado de muitos fragmentos em frente ao mar. Sobre as pontas
muitas cadeiras de pescadores. Aquela extremidade da praia é deserta.
Nem os pescadores aparecem.
Um grupo de meninos escondia-se na areia,
arrastavam-se no chão, eram caranguejos e corriam para a trincheira de areia,
em seus pés chegava a água em ondas, eles não se incomodavam com a água que de
momentos em momentos ganhava um pouco de espaço na areia.
Trincheira, areia, água, meninos.
Os meninos abrigavam-se na trincheira para não
serem percebidos por um casal de namorados. A namorada deitada. Ela vestia um
vestido vermelho. O namorado beijava-a e alisava o corpo mal coberto de menina.
O casal escolheu aquele local perto do muro onde estariam ao abrigo dos curiosos, para eles
além do muro, nada mais existia do que o mar e o muro.
Entre o muro e o mar estava o bando de meninos.
Oito, nove meninos silenciosos, cautelosos, de pau
duro, tudo na mão. Paco caminhou em direção ao muro, antes que ele saltasse
para a areia, Arthur segurou-o e disse baixinho, "não, velho do mar, não
atrapalhe o amor de areia, nem a imaginação das crianças".
Paco admirou-se com a cena dos namorados e dos
meninos. Sheila e Mary, antes da curiosidade, pensaram na máquina. Tiraram
fotos dos meninos nas trincheiras. Enquanto Sheila procurava ângulos, Valente
conta piadas. Fala baixo. Não incomodará ninguém.
Todos entraram descalços na areia. Os três, Paco,
Valente e Arthur viram-se de costas para o mar, as mulheres tiraram as meias e
Sheila fotografou os três de costas. Ao sul não existia só o mar. O ritmo do
mar e o movimento das ondas traziam suavidade. Era a suavidade das músicas dos
meninos. Ritmo que nos faz pensar, um pensar triste, apenas um pensar ou quase um
pensar em nada.
Paco tirou a camisa. O sol cobriu-lhe a pele. A
praia de Pocitos é uma praia pequena, com o sol e gente. Pocitos tão pequena
que parecia praia sem areia tantos os panos e tantos os corpos. Valente viu
Quitcha e Selva. Manequins desfilando a estação. Duas modelos a qualquer
momento. Mulheres que são panos e cosméticos.
Quando noventa e nove por cento de você é roupa.
sua personalidade está no pano.
Sua personalidade também pode sair da moda.
- Ele parece que não faz mais barba – observou Quitcha
de longe.
- Inútil obrigá-lo a barbear-se.
Selva de olhos verdes, grandona, vive como um
moleque, brinca de todos os jeitos e em todas as posições, brinca com
todo mundo, sempre inventa brincadeiras novas.
De vez em quando faz coisas serias para
distrair-se. Agora jogava pedrinhas nas pernas das pessoas.
*
Sheila com dor de barriga, queria encontrar um
restaurante, um banheiro por perto. Sheila olhou a avenida. Sheila peidou e
aliviou-se um pouco, um pouquinho só, Paco apertou o nariz. Todos apressaram o
passo, na avenida. Os carros ainda refletiam o sol.
Vamos a um restaurante gente, Sheila sentia o corpo
dolorido, a barriga estava inchada e doía, conteve outro peido. Controlou-se.
Para que segurar? Soltou-o devagar, silencioso. Suava frio. Direto para o
banheiro do restaurante.
A merda caiu na água, ploc e salpicou na bunda.
Tamanho foi o alívio que nem se preocupou com as gotas de água. O papel estava
longe, ela levantou-se segurando o vestido e de pernas abertas caminhou até o
papel, tirou uma porção de folhas, dobrou-as e esfregou. Olhava cada papel para
ver o primeiro que saia limpo, aí esfregou o ultimo com força, saiu sujo, um pouco.
*
Mary pediu chá para todos.
- Mais açúcar, senhorita?
Mary respondeu e acompanhou o braço do garçom, as
mangas brancas, amarrotadas na junta, limpas, sombras, as tonalidades do
branco, o reflexo da luz.
- Quer dizer que você chegou hoje, camarada? –
perguntou Paco.
- Desci com sol quente em Carrasco.
- Viajar de avião é muito perigoso.
- Morrer no ar, no mar ou na terra é a mesma coisa.
- As probabilidades de cair são maiores que a de
afundar.
Arthur não queria continuar aquela conversa, não simpatizava
com o homem do mar.
- Eu acredito em destino. Quando chegar sua hora de
morrer, você morre até debaixo da cama de um corno, por isso eu arrisco.
Arthur olhou-o nos olhos.
- Tenho que elogiar a sua irracionalidade – cortou
Valente.
- Eu também creio no destino, só que eu ajudo um
pouco o negócio. Não arrisco. Estamos no mundo das probabilidades. Porque arriscaria?
- Destino.
Mary disse a palavra e a pronunciou mentalmente
sílaba por silaba dês-ti-no.
- Eu acredito que a gente tenha um destino. O
destino que escolhemos. Ou plantamos. Quanto à morte... se se pudesse evitar,
eu a evitaria. Gosto de viver. A vida é bela. La
vita é bella. Viver é a minha paixão. Agora que vamos morrer, eu
sei disso. Por que? Sei apenas as razões físicas. Não acredito em mais nada
além da vida. Além disso meu pensamento é o pensamento de um ateu. Nesse
negócio de destino entre o nascer e o morrer, quem manda somos nós mesmos.
Temos que saber é se existe mesmo vida antes da morte.
- Concordo. Destino seria a vida programada. Você
sabe que com tais e tais atos chega-se aqui e ali, não é mesmo?
Sheila podia ter continuado e sua pergunta ser
respondida, o estouro de uma garrafa deixou em cacos seu pensamento, ela queria
deitar-se.
Paco chamou o garçom varias vezes, quebrou o bule
de chá, o garçom apareceu. Na rua, Arthur pediu para deixá-lo dirigir.
Quando saíam de Ramirez, depois de terem deixado Pocitos,
Mary, a pedido de Arthur, foi até o Cassino em companhia de Paco. Mary voltou
só.
- Entre no carro, Mary – disse sério Arthur.
- E o Paco?
- Entre no carro.
Mary entrou, Arthur acelerou.
Paco continuou a conversar no Cassino, ao chegar na
rua estranhou a ausência do carro.
Embriagado, ficou por ali uns cinco minutos. Ia e
vinha de uma calçada para outra.
O sol de quatro e meia estava quente.
- Paco, homem, como ë? – gritou-lhe o croupier.
- Nada irmão. Levaram-me o carro.
- Roubaram?
Uma gargalhada encheu a quase noite dos ouvidos de
Paco.
- É isso, roubaram – carro, mulher, amizade,
bagagem, noite, pois é!
Outra gargalhada ganhou o início de noite do
croupier.
Daí a pouco encostou um carro da polícia
metropolitana. Paco sequer cogitou de que estavam ali por perto por causa dele
El Paco. Os policiais entraram e saíram do Cassino.
- Senhor Paco, roubaram-lhe o seu carro?
Paco enfureceu-se, olhou para o croupier, examinou
o carro dos policiais (não é o meu, não), examinou os policiais (e agora,
Antenor?).
- Senhor Paco, fomos chamados porque roubaram o seu
carro..
.
- Roubaram, afirmou o policial-chefe, e o senhor
podia colaborar com a polícia, precisamos de dados, marca do veículo e placa.
- Posso. Meu carro é um Volks-Ford, amarelo, azul e
preto.
O croupier deixou cair o queixo, barba, cabelos,
perucas, nariz, tudo, embasbacou-se.
- Volks-Ford?! – estranhou o policial resumindo, o
que está à direita.
- Volks-Ford é um carro brasileiro, esporte, último
modelo, lançado no Brasil o ano passado. Vocês não acompanham os lançamentos?
- Acompanhamos... responderam todos como um coral.
Vinte e sete minutos discutiram sobre os lançamentos de veículos, esquecendo os
policiais a sua missão, esquecendo o croupier as suas cartas e esquecendo Paco
a sua embriaguez. Paco erguia os braços, o policial da direita coçava o bigode,
o mais alto alisava as pernas e o croupier gesticulava para se expressar. Agora
tentam identificar o carro de Paco.
- Eu já vi esse carro na rua.
- Me lembro.
- Produção brasileira, Volks-Ford Mercedes, não?
- Volks-Ford,
só.
-Que aliança! Aliança de muçuarama. Muçurana, mussurana,
cobra preta, Clelia, minha doce Clélia lá da Pompéia
- Volks-Ford?
Ano?
- 1096, aliás 1968, troco as bolas.
- Chapa?
- Chapa PQP 10-20-6
- Chapa Pê quê pê 10-10?
- 10-20-6
- 10-20-6, obrigado, senhor
- Tome, são
trocados.
- Ah! tinha uma mulher com o senhor?
- Tinha.
- Suspeita dela?
- Não. Mas que ela desapareceu, desapareceu.
-O Sr. viu os ladrões?
- Não, não os conheço.
O croupier recolheu os cabelos, as barbas,o bigode,
a peruca, o nariz, o queixo, as lentes e levou os policiais até o bar.
- Esqueçam este roubo, aconselhou o croupier. Eu
acho que precipitei. Os ladrões são amigos dele. Na verdade roubaram-lhe foi a
mulher.
-
Não entendi?
https://todagentetodomundo.blogspot.com/2017/12/bagatelas.html
10.07.2020 20.03.2022