quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018

NOVA RECEITA






Resultado de imagem para Caminhoneiros

Veja, do outro lado do muro,

onde nasceu o cajueiro.

(É a mais bela de todas as árvores do quintal)




 

“Era um bom companheiro de viagem. Alegre. Com ele não liguei mais o rádio, como um narrador de futebol, ele carregava de emoção suas histórias.

Era um homem capaz de tudo.

- Você conhece Monlevade?

Certa vez, chegamos numa cidade pequena, um lugarejo, antes de Monlevade.

No hotel, apareceu um moço magro. Dizia-se doente. Meu companheiro examinou o rapaz. Os dois conversaram um tempo.

O rapaz tirou do bolso uma receita. Ele a apanhou e leu. Apontava para a receita e falava com o rapaz. Levava a mão na cabeça. Ria.

O rapaz não conseguia rir. Tentava.

Disse para o rapaz que a medicação estava errada para aquela doença. Apanhou um papel e escreveu a nova receita, como sempre fazia, letra ilegível, onde, segundo ele, os rabiscos de sua assinatura significavam doutor Droguinha das Drogas Oliveira.

Este último era quase legível. Seguimos viagem. 

Meses depois, estávamos de volta à cidade.

Ao lado do hotel, havia uma mesa de sinuca num bar. Descemos do caminhão e fomos direto ao bar. Meu companheiro observava o jogo de sinuca e perguntou pelo rapaz. Explicou quem era.

Um dos jogadores, sem se voltar, contou que o rapaz havia morrido em virtude de uma intoxicação.

“Ele trocou uns medicamentos, explicou, receita de um médico vagabundo e morreu”.

Não continuamos na cidade. Voltamos para o caminhão e seguimos viagem. Meu companheiro teve medo de que o reconhecessem no hotel como o homem que trocou as receitas.

Esse meu companheiro, bom narrador, gostava de tirar uma de médico.

Baixinho, usa óculos e tem mais de sessenta anos. Velho estradeiro, destes irresponsáveis.

Eu briguei com ele, ameacei-o de morte, mas ele chorou e disse que o rapaz doente foi o próprio responsável pela morte.

“Garanto, dizia, o rapaz misturou os remédios. Eu havia explicado para ele que não podia misturar, falei que era perigoso. A mistura virava veneno”.

Não falamos por mais de uma hora de estrada, quando ele quebrou o silêncio.

Murmurando


“Por que será...? Por que será que ele suicidou?”

O nome do velho médico de estrada é Jair Laurindo Santos Pereira.

(História de Germano, o motorista, preso nas celas da Pç Marechal Âncora)