segunda-feira, 18 de fevereiro de 2019

VIDA POR UM FIO


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O decadente



Simão Sardinha de Almeida Filho





Cinco dentes, os três primeiros, ele tirou da boca e jogou no chão. Estava atrás das grades e os dois amigos que estavam do lado de fora e sentados  cataram os dentes. Eram dentes quase inteiros e sem sinal de sangue. Assim eles saíram de sua boca.

A impressão  era de que perdera os dentes e que nada de mal fisicamente lhe acontecera. Apenas perdera os dentes. Em sua arcada nenhum sinal de que perdera os dentes.

Era como se nada tivesse acontecido. Afinal seus dentes verdadeiros pareciam estar no lugar ou pelo menos ele não sentia falta dos dentes. 

Nenhuma aparência externa de que tivesse perdido tantos dentes. Também raramente abria a boca para um sorriso.

Disseram que ele estava decadente e que a sua vida estava por um fio. 

Nilmar providenciou para que o levassem para um dos quartos.
Antes, ele passou em seu próprio quarto. Não entendia direito porque iria para outro quarto se tinha o seu lugar.

Nilmar estava em dúvida se devia gravar seu depoimento ou se pedia a um dos repórteres, um rapaz magro e alto que o acompanhava, para que tomasse as notas.

O melhor seria gravar e ter o material para ser retirado e editado em outro momento.

Deitado na cama sob as luzes e a câmera de uma televisão, filmado, o quarto cheio de gente, ele recebeu um disco de vinil de presente de um seu ex-aluno, que esteve no Iraque.

Um disco de um grupo bom, muito bom, e eles queriam filmar também a capa do disco, identificando os músicos.

Ouviu quando disseram que ele estava decadente.

Indiferente como quando jogou os dentes no corredor da cadeia.