A prisão que carrego nas costas
Rufino Fialho Filho
Cultivo una rosa blanca
José Marti
Cultivo una rosa blanca
En junio como en enero
Para el amigo sincero
que me dá su mano franca
Y, para el cruel que me arranca
El corazón com que vivo,
Cardos ni urtigas cultivo:
Cultivo una rosa blanca
O que são os sonhos? Já havia acordado, levantei e voltei a
deitar. Foi pouco depois das 5h. Amanhecia, dia frio e chuvoso, embora não mais
caísse aquela água permanente, sentia-se a umidade. Tempo frio. Úmido. Deitei,
cobri-me com três panos e o meu corpo estava quente. Na madrugada chegara a
suar. Idade? Andropausa?
Sonhei. Primeiro com os meus filhos, Raquel, Raquel e Isabela. Nós
dois, mais ela, atentos com Isabela, em um lugar que mais parecia um clube e
cheio de gente, muitas pessoas, rapazes e moças. Raquel pergunta indignada por
Isabela e afirma categoricamente o nome de um rapaz. Quando nos aproximamos,
Isabella está sentada, forte e segura, embora com o rosto triste, mas triste
por causa do seu desempenho. Ela não gostara da apresentação que fizera.
Depois, talvez nesta mesma festa, eu acompanhava uma criança
pequena que começava a caminhar. Caminha por todos os lados, toma suas
primeiras quedas comigo e é inquieta, quer entrar em todos os lugares e sair,
entrar e sair.
Aí o outro sonho, volto à minha casa e na rua mal consigo
encontrá-la.Como sempre vejo estas cidades, a casa está em obras. Não é só a
casa. Toda a cidade. Obras por todos os lados. Prédios explodindo, onde antes
não imaginávamos que prédios poderiam surgir, por todas as razões e, principalmente,
pela proibições das posturas municipais.
Lá estavam os prédios saindo em meio às casas. A nossa casa estava
lá em meio a um tumulto. Coisas do lado de fora e a casa dividida, uma parte
era uma firma, ela está, chamo, ela e o seu novo companheiro, velho
companheiro, um crioulo baixinho (idêntico ao crioulo de Mariazinha), vem
atender. Ela me abraça.
Controlo o meu corpo e o dela. Não tenho a mesma liberdade que
ela, ela me abraça e choramos, sua irmã está na sala. Choramos e falamos “e os
nossos filhos?”
Choramos e choramos, as pessoas sentam, sinto que o crioulo é um
homem bom. Sinto. A irmã dela também chora e sai da sala.
Eu me pergunto sobre o que é o amor, pois eu ainda a amava mesmo
com toda a consciência de tudo, de tudo o que sofremos, por tudo, por nossas
inconsequências, irresponsabilidade. Eu. Eu, o irresponsável, por nunca ter
sabido amar. Por nunca ter sido capaz de na minha imensa paixão e amor, de
jamais ter sido capaz de entender, corresponder e ser um ser verdadeiro para um
outro ser.
A verdade é que não era verdadeiro nem para mim.
Sento na cama com este sonho na cabeça, sem saber se o anotaria
agora ou depois. Depois o esquecimento era certo.
Sento na cama. Sete horas, tenho que levantar para trabalhar.
Sento na cama, só. Olho em volta, na janela e vejo as grades.
Grades.
É, lá estão elas, embora seja um quarto da casa do meu pai, ali
estava eu, como eterno prisioneiro de volta à prisão.
Era um catre, talvez a cela de um seminário. Talvez o quarto da
própria casa do meu pai. Mas era uma prisão.
Eu mais uma vez, como sempre,
irremediavelmente, preso.
Numa prisão que carrego “em meu próprio dorso”.